Por influência norte-europeia, a madeira assume um papel relevante na produção escultórica, destacando-se Coimbra novamente na difusão de uma nova estética, que abarcaria todo o país. Aqui trabalham alguns dos maiores escultores flamengos destacando-se a presença do escultor e entalhador Olivier de Gand que, ao serviço do Bispo-Conde D. Jorge de Almeida, executa a maioria das peças que o Museu possui, realizadas para a Sé, o Paço Episcopal e conventos da cidade e região.
O séc. XVI em Portugal é uma época complexa, de abertura e conservadorismo, de inovação e tradição. Por um lado, o Gótico tradicional das oficinas da região de Coimbra, por outro a arte flamenga veiculada por artistas vindos do norte da Europa e, por outro lado ainda, o aparecimento das novas formas e fórmulas da Renascença. Assim, a escultura manuelina pode caracterizar-se formalmente como sendo de transição entre o Gótico final e a Renascença.
Coimbra continua na primeira linha, no que respeita ao número de obras executadas, mas surge agora com outra dinâmica e influências, graças à presença de artistas espanhóis, franceses, flamengos e alemães na cidade. Aliás, nesta época é elevado o número de estrangeiros a trabalhar em Portugal.
Marcando a escultura do início deste século, destaca-se Diogo Pires-o-Moço com um conjunto de obras em que perdura o gosto tardo-gótico. Trata-se de um artista local, que se constitui como elo de ligação entre a tradição gótica em fase de renovação e a linguagem renascentista, revelando uma influência profunda dos imaginários flamengos, tão ao gosto dos comitentes portugueses.
Embora a influência norte-europeia se revele em algumas das obras talhadas em pedra, a corrente que vinga é todavia a dos franceses que, na primeira metade de Quinhentos se vêm estabelecer em Coimbra – Nicolau Chanterenne, João de Ruão e Hodart os quais têm, em comum, a formação em centros onde as expressões artísticas do Renascimento italiano são conhecidas.
O Museu possui um vasto número de obras deste período, que testemunham uma característica bem evidente – a alteração das dimensões e dos volumes. São grandes retábulos e altares, povoados por diversas cenas em relevo e imagens de vulto perfeito, a eles dimensionadas, em que a temática religiosa é quase exclusiva, com destaque para os temas ligados Virgem e a Cristo, em especial ao ciclo natalício.
O primeiro francês a fixar-se em Coimbra, e o mais ligado à nova estética renascentista é Nicolau Chanterenne. Escultor preferido pela corte e pela nobreza culta da época granjeia grande reputação com as estátuas jacentes por ele realizadas para os túmulos reais do Mosteiro de Santa Cruz. Desconhecendo-se o nome do(s) artista (s) a quem se deve a realização desses túmulos, persiste alguma confusão entre a obra de Chanterenne e a do hipotético “Mestre dos Túmulos Reais”.
A atividade de J. de Ruão decorre, em Coimbra, durante cerca de 50 anos. Dotado de uma notável capacidade de adaptação ao meio, é o mais sensível à cultura portuguesa. Pela sua oficina passam várias gerações de escultores e decoradores que vêm a estabelecer-se por todo o país.Na sua obra-prima – a Capela do Sacramento na Sé Velha – ou na Capela do Tesoureiro, hoje integrada no Museu, Ruão deixa bem patente a sua dupla qualidade de escultor e arquiteto. Os seus enquadramentos arquitetónicos, sobriamente ornamentados, estão presentes nas grandes obras da coleção do museu – retábulos, painéis relevados, conjuntos escultóricos. Figuras serenas e majestosas, de brandos movimentos, arredadas de qualquer exteriorização de sentimentos, coexistem na sua obra, ao lado de personagens dramáticas, cheias de força interior e movimento, apresentando por vezes ligeiras deformações anatómicas intencionais, para impressionar. As primeiras correspondem à natureza do artista; as segundas surgem por influência de Chanterenne e mesmo de Hodart.
Hodart é um artista isolado, de caráter agitado, revelando uma forte personalidade patente na sua obra. Considerado quase um génio, não é de estranhar que tenha antecipado em décadas o surto barroco em Portugal. É essencialmente um escultor barrista, cuja obra mais notável é hoje pertença deste Museu. Trata-se da Última Ceia executada em tamanho natural, para o Refeitório do Mosteiro de Santa Cruz.
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