Alguém escreveu que para ser agradável «um discurso deve ter as três qualidades do vestido feminino: talhado para a ocasião, elegante e curto ... mas extenso o suficiente para cobrir o essencial.»
Tenho de apelar à vossa paciência, pois, para cobrir o essencial, é de inteira justiça que demonstre o meu reconhecimento pela organização desta atividade do lançamento do livro O Museu de Imagens na Imprensa do Romantismo. Património arquitetónico e artístico nas ilustrações e textos do Archivo Pittoresco (1857-1868).
Agradeço ao Senhor Diretor do Agrupamento de Escolas Artur Gonçalves, Professor Acácio Neto, que foi o autor da ideia de realizar este evento inserido nas atividades do Agrupamento.
Agradeço às colegas da Biblioteca Escolar, nomeadamente à Coordenadora Felisbela e à minha colega Ana Paula Ferreira, que sugeriram que a atividade se realizasse no âmbito da feira do livro do Agrupamento e, de diversas formas, contribuíram para a sua organização.
Agradeço à Coordenadora da Escola Dr. António Chora Barroso, a minha colega Dina, pela organização da logística inerente a esta sessão.
O meu sincero agradecimento aos alunos do Curso Profissional de Multimédia (entre os quais reconheço ex-alunos) pelo trabalho que produziram e no qual foram superiormente orientados pela Professora Sílvia Filipe, que foi inexcedível no apoio a este projeto.
Expresso a minha gratidão ao Professor Carlos Rodarte Veloso por ter aceitado o convite para a apresentação do livro e pela excelente lição que nos proporcionou.
Em nome da Senhora Vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Torres Novas, Dr.ª Elvira Sequeira, estendo o meu agradecimento a todas as entidades presentes nesta sessão.
Confesso que estou muito sensibilizado pela presença de muitos colegas, alunos, ex-alunos e quiçá futuros alunos, pais e encarregados de educação. Também quero manifestar o meu agrado pela presença de muitos amigos e a todos que se quiseram associar a esta iniciativa.
Peço que me autorizem uma breve digressão autobiográfica
Todos os livros têm o seu contexto e a sua própria história. A investigação que deu origem a este livro foi iniciada quando exercia a docência na Escola Secundária Artur Gonçalves em Torres Novas e a finalização da escrita aconteceu quando lecionava na Escola Básica Dr. António Chora Barroso de Riachos. Como é compreensível o livro foi escrito paralelamente a uma intensa atividade docente com 7 a 9 turmas, que correspondem a um número de alunos que ultrapassa largamente a centena e sempre associada ao desempenho de outros cargos. Não faço esta alusão ao contexto da investigação e da escrita do livro para me lamuriar. Porque estranhamente ou não, o ato de investigar na área da história é pessoalmente um ato que me satisfaz intelectualmente. Julgo ter compreendido uma situação que me intrigava quando frequentava a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Tinha um colega que habitualmente dizia: “hoje estou a sentir-me fatigado vou para casa fazer uma tradução de latim”. Eu só tive uma breve introdução ao latim, mas realizar traduções de latim para português era para mim torturante. Mas se eu vos dizer que hoje estou cansado e vou para casa ler jornais do século XIX, estarei a falar honestamente, porque é uma atividade de pesquisa que verdadeiramente me agrada.
Um historiador francês afirmou que quando estamos a investigar não sentimos o peso dos dias. Porque, na realidade, a investigação na área historiográfica tem algo de detetivesco. No fundo, é como escrever um romance policial do fim para o início. Já sabemos o que aconteceu, mas vamos procurar compreender por que motivo ou motivos é que sucedeu assim e não de outra forma.
E esta característica da descoberta, da busca da compreensão das causas que estão na origem de um determinado acontecimento, despertou em mim o gosto pela investigação na área da ciência histórica. Ocasionalmente vivem-se pequenas alegrias no silêncio de um arquivo, de uma biblioteca ou na solidão do nosso escritório. Quando se descobre a resposta para uma questão que ainda não tínhamos compreendido e que, naquele momento, compreendemos ou vivemos a ilusão de ter compreendido. Porque a verdade na ciência da História é sempre muito relativa e estamos verdadeiramente perante o mito de Penélope que durante o dia tece o sudário e que durante a noite o desfaz.
A investigação em que se baseia este livro incidiu sobre a imprensa ilustrada oitocentista. É uma fonte para a história de uma época à qual já dedico alguma atenção desde 1991/1992. Quando me preparava para escrever a dissertação de licenciatura no seminário de História Contemporânea estava predisposto a estudar as relações que se estabelecem entre a Literatura e a História. Mais precisamente, procurava compreender a ficção histórica e as imagens do passado que se constroem nessas narrativas. Um dos primeiros problemas com o que o aluno de ciências humanas se debate é o de limitar o tema, para que seja possível apresentar um texto coerente e obedecendo a exigentes critérios académicos, em poucos meses. E, nesse momento, tracei o plano de estudar os textos de ficção histórica publicados no jornal O Panorama (1837-1868). Existia uma coleção deste periódico na Sala Joaquim de Carvalho na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e a orientadora da tese, a Professora Maria Manuela Tavares Ribeiro, a quem devo o convite para a publicação do presente estudo, que também radica no seu magistério e orientação inicial, requisitou esses volumes para eu os poder ter em casa durante alguns meses. Dessa forma não estava sujeito às limitações dos horários das bibliotecas. Foi durante esse estudo que me apercebi das potencialidades destas publicações para nos ajudarem a compreender uma época da História de Portugal, o complexo movimento cultural designado de “romantismo”.
Posteriormente realizei vários estudos nesta área até que no mestrado de História da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, dirigido pela Professora Lurdes Craveiro e com a orientação da tese de mestrado pelo Professora Pato de Macedo, considerei interessante explorar o conceito de património arquitetónico e artístico na imprensa ilustrada. Surgiu a oportunidade de estudar o semanário Archivo Pittoresco, que José-Augusto França considera a revista mais característica do período romântico-liberal português.
Já foi com o decorrer da investigação que me fui apercebendo que na escolha deste assunto se entrelaçavam várias linhas temáticas que tinham como ponto de encontro a cultura portuguesa do século XIX. A história da imprensa, da gravura em madeira, da noção de património e dos primeiros estudos científicos na área da historiografia da arte com a definição de uma terminologia específica e de conceitos estilísticos.
O interessante deste projeto de publicação de jornais ilustrados radica no seu objetivo iluminista de democratizar a instrução no período histórico do triunfo da monarquia constitucional e em que se pretende construir o cidadão que vem substituir o súbdito do período absolutista. No fundo, estas publicações funcionavam como um mecanismo compensatório relativamente a um Estado que ainda estava incipiente na área da instrução. A intelectualidade romântica assume esta tarefa de derramar a civilização num país em que a taxa de analfabetismo era superior a 80%.
A divulgação do património arquitetónico e artístico, sustentada pela multiplicação visual dos monumentos e objetos artísticos nas suas páginas, pretendia ilustrar textos que apresentam diferentes níveis de profundidade científica e apoiam o leitor no conhecimento desse património, apesar de também condicionarem a sua leitura de acordo com uma perspetiva ideológica e cultural definida no contexto do romantismo português. É possível comprovar a valorização da arte gótica e manuelina, sempre associada pela sensibilidade romântica à idiossincrasia nacional municipalista e, de uma forma geral, a crítica aos estilos renascentista e pós-renascença, identificados com a influência estrangeira e o triunfo das monarquias absolutas. Os monumentos e outros objetos artísticos são perspetivados como padrões comemorativos de uma história nacional gloriosa, testemunhos de feitos populares que preservam a identidade nacional. É este o discurso predominante nos textos sobre esta temática publicados no Archivo Pittoresco, onde se observa o comprometimento do intelectual com uma missão patriótica, na esteira da teorização herculaniana, de divulgação e proteção do património.
Penso que a escassa investigação da história da gravura está relacionada com o facto de lhe ter sido atribuído um carácter obreiro, enquadrado no âmbito da indústria tipográfica, a este tipo de produção artística. A maioria dos exemplares são obras coletivas com a intervenção conjunta de um delineador e de um gravador. Frequentemente o delineador limita-se à reprodução de uma imagem que já existe, depreciando a vertente criativa do ato artístico. No caso do gravador é lhe atribuída a função mecânica de traduzir um trabalho de outrem. Esta perspetiva, que considero redutora, esteve na origem de alguma marginalização destas produções artísticas pela historiografia da arte. Na realidade, ultrapassando a qualidade técnica, subsiste em muitas gravuras um aspecto inventivo e original paralelo a uma produção imagética meramente reprodutora. A gravura situa-se assim num relativo limbo por figurar na charneira entre a simples técnica de reprodução e a obra de arte.
Não quero abusar da vossa paciência, mas o tema parece-me tão interessante que por vezes dou por mim a falar deste assunto com um desconhecido que está sentado ao meu lado no autocarro.
Dediquei este livro às minhas filhas, Madalena e Constança e à minha mulher, Lia, com quem partilho uma viagem que se prolonga por vinte e cinco anos. O livro deve muito ao seu encorajamento diário e à sua cumplicidade. Mas não é necessário agradecer-lhe com palavras, primeiro porque nunca serão suficientes e depois porque basta um encontro do olhar para sabermos o que sentimos mutuamente.
Termino agradecendo novamente a presença de todos.
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